Furiosa é mais um fracasso nas bilheterias de uma temporada decepcionante
Furiosa, uma prequel da série Mad Max, estreou com péssima bilheteria nos EUA e no mundo e é mais uma decepção em um ano já repleto delas.
Durou pouco a euforia na indústria do cinema vista em março na indústria do cinema. Após as boas performances de longas como Duna: Parte Dois, Kung Fu Panda 4 e Godzilla e Kong, desde abril não estreou um único blockbuster forte, capaz de manter as bilheterias de 2024 ao menos no nível das de 2023 – ou pelo menos impedir uma queda tão grande em relação ao ano passado. Agora, o desastre de Furiosa: Uma Saga Mad Max escancara o péssimo momento vivido por Hollywood nos últimos tempos.
O longa, uma prequel do aclamado Mad Max: Estrada da Fúria, lançado em 2015, arrecadou apenas US$ 26,3 milhões no fim de semana e US$ 32 milhões entre sexta e segunda, que foi feriado de Memorial Day nos EUA.
Como comparação, seu predecessor de nove anos atrás faturou US$ 45,4 milhões em seus três primeiros dias, e mesmo tal valor já foi considerado uma decepção dado o alto orçamento e toda a aclamação que o longa recebeu. Nem sequer liderar as bilheterias em sua estreia ele conseguiu já que, naquele fim de semana, quem ficou em primeiro lugar foi A Escolha Perfeita 2 (US$ 69 milhões).
No Brasil e no mundo, Furiosa também foi uma decepção. Por aqui, o longa arrecadou R$ 7,4 milhões e vendeu 326 mil ingressos. Isso é pouco mais que a metade do público de abertura de Estrada da Fúria (628 mil pagantes), que também não foi exatamente grande coisa: apenas a 21ª maior de 2015 – um ano em que, vale lembrar, a indústria do cinema estava incomparavelmente mais saudável do que em 2024. Ficou abaixo de filmes muito menos elogiados, como Pixels (648 mil ingressos), Maze Runner: Prova de Fogo, O Exterminador do Futuro: Gênesis (ambos com 652 mil) e o Quarteto Fantástico de Josh Trank (687 mil).
Globalmente, Furiosa possui US$ 65 milhões, um número totalmente medíocre e que fica ainda pior quando comparado com seu orçamento de US$ 168 milhões, tão grande quanto o de Estrada da Fúria (que ficou entre US$ 155 milhões segundo a produtora Kennedy Miller Mitchell e US$ 185 milhões segundo a Warner Bros).
Mas a pior parte é que este não foi o único flop do mês. Por conta da greve dos roteiristas e atores no ano passado, numerosos filmes que poderiam ter sido sucessos de bilheteria em 2024 acabaram sendo adiados para os anos seguintes. Em março, isso conseguiu ser mais ou menos disfarçado por causa da performance melhor que o esperado de Duna 2 e Kung Fu Panda 4, porém a partir de abril a fraqueza dos únicos longas que restaram em 2024 ficou bem evidente.
O mês passado na bilheteria americana foi liderado por Godzilla e Kong (que estreou em 29 de março), o único filme que conseguiu arrecadar mais de US$ 60 milhões em abril (ao todo, os dois kaiju faturaram US$ 196 milhões, sendo US$ 102 milhões disso entre 1º e 30 de abril). Abaixo dele, o estreante Guerra Civil fez apenas US$ 57 milhões (de um total de US$ 68 milhões) no decorrer do mês.
No geral, o faturamento de abril em 2024 foi 52% menor que o do mesmo mês em 2023 (que trouxe o bilionário Super Mario Bros.: O Filme) e 58% menor que em 2019, o último ano pré-pandêmico. Se comparado com 2017, o último antes da pandemia que não contou com um mega blockbuster dos Vingadores no fim do mês, a queda é de 47%.
Ainda assim, maio é considerado o mês em que a temporada de blockbusters começa de fato. Porém, ao contrário de todos os anos entre 2007 e 2023 (à exceção de 2020 e 2021, claro), o candidato a sucesso de bilheteria não foi um longa da Marvel mas sim O Dublê. Estrelado por Ryan Gosling e Emily Blunt, trata-se de um longa de ação à moda antiga (leia-se: antes da dominação dos super-heróis e franquias baseadas em propriedade intelectual existente), que buscava atrair o público apenas com o carisma e charme de suas estrelas e não devido a alguma conexão com universos compartilhados.
Não deu certo: a um custo de US$ 125 milhões (o que é caro demais para um filme sem alguma propriedade intelectual forte ligado a ele), O Dublê faturou apenas US$ 146 milhões globalmente, sendo US$ 74 milhões nos EUA e US$ 71,6 milhões nos mercados internacionais. É um total abaixo de Trem-Bala, o filme de ação anterior do diretor David Leitch, que custou menos (US$ 86 milhões) e arrecadou mais (US$ 238 milhões global).
Uma semana depois, Planeta dos Macacos: O Reino saiu-se um pouco melhor. Estreou com US$ 56,5 milhões nos EUA e US$ 130 milhões global. Trata-se de uma abertura muito próxima à de seus antecessores Planeta dos Macacos: A Origem (US$ 55 milhões em 2011) e A Guerra (US$ 56 milhões nos EUA/US$ 130 milhões global em 2017). O segundo longa da trilogia do César de Andy Serkis, intitulado O Confronto, é o único da saga dos macacos que foi muito além disso (estreia de US$ 72 milhões nos EUA).
Porém, há dois problemas. O primeiro é que, quando ajustadas pela inflação, as estreias de A Origem e A Guerra foram de US$ 75 milhões e US$ 67 milhões respectivamente enquanto a de O Confronto foi de US$ 95 milhões. Ou seja: a franquia acabou perdendo público nos quase sete anos que separam O Reino de A Guerra.
Além disso, O Reino ainda foi bastante caro: US$ 160 milhões para ser produzido segundo a Disney. Até o momento o filme soma US$ 298 milhões, e terá alguma dificuldade em alcançar os totais entre US$ 470 milhões e US$ 490 milhões (que, aliás, é o que o filme precisa para não dar prejuízo) de A Origem e A Guerra (O Confronto, o auge da franquia em termos financeiros, faturou US$ 711 milhões em 2014).
Na semana seguinte houve a estreia de Amigos Imaginários, que é uma completa anomalia nos dias de hoje: um filme infantil totalmente original, sem ser baseado em nenhuma franquia famosa, e de alto orçamento: US$ 110 milhões. Uma aposta arriscada da Paramount, mas que infelizmente não deu certo: abertura de US$ 33,7 milhões nos EUA e um total após 11 dias em cartaz de US$ 63,5 milhões na bilheteria americana e US$ 40 milhões na internacional, resultando em US$ 103,5 milhões global, muito abaixo dos cerca de US$ 330 milhões que o longa precisaria para ser lucrativo.
No último fim de semana, feriado de Memorial Day, tivemos os números decepcionantes de Furiosa e também da animação Garfield: Fora de Casa. Este último, se não foi a segunda vinda de Super Mario Bros, ao menos não fez feio em relação ao orçamento: arrecadação de US$ 31,1 milhões nos EUA e US$ 97,4 milhões global a um custo de US$ 60 milhões.
Então, o que está havendo? O que explica essa sequência de flops? Será que as pessoas finalmente perderam o hábito de ir ao cinema? Não é o que os resultados de Duna 2, Godzilla e Kong e Kung Fu Panda 4 neste ano e os de Oppenheimer, Mario e Barbie em 2023 indicam. Não, as pessoas continuam dispostas a ir ao cinema desde que tenha algo em cartaz que as faça sair de casa e pagar por um ingresso, o que não é o caso das últimas estreias.
Veja Furiosa por exemplo: por mais adorado que Mad Max: Estrada da Fúria seja entre críticos e nerds, ele não foi nenhum sucesso de bilheteria. Pelo contrário: a um custo exorbitante, seu faturamento ficou em US$ 380 milhões, o que não só é abaixo do que seria necessário para dar lucro (uma fonte informou ao Deadline que o longa de 2015 “custou demais” e teve altíssimas participações no rendimento das bilheterias dos artistas envolvidos) como também arrecadou menos globalmente do que outros filmes daquele ano muito menos adorados pela crítica como Terremoto: A Falha de San Andreas (US$ 475 milhões) e Cinquenta Tons de Cinza (US$ 569 milhões).
Em outras palavras, toda a aclamação que Estrada da Fúria recebeu na internet não se traduziu em bons números nas bilheterias, ainda mais em uma temporada dominada pelos bilionários Vingadores: Era de Ultron, Jurassic World: O Mundo dos Dinossauros e Minions.
E ainda assim a Warner se comprometeu a investir US$ 170 milhões em uma prequel com a intérprete da Furiosa no filme original (Charlize Theron) substituída por uma atriz bem mais jovem (Anya Taylor-Joy), sem perceber que este foi o mesmo erro cometido pela Disney com Han Solo: Uma História Star Wars e Lightyear.
Claro, artisticamente é ótimo que os grandes estúdios estejam se comprometendo a gastar valores absurdos na produção de filmes autorais de cineastas como David Leitch, John Krasinski (Amigos Imaginários) e George Miller (Furiosa). Entretanto, após o golpe duplo contra os cinemas que foi a pandemia e as greves do ano passado, a temporada de 2024 acabou ficando carente de opções fortes de modo que, na falta de um blockbuster da Marvel ou sequência de Jurassic World, exige-se que O Dublê, Planeta dos Macacos: O Reino, Amigos Imaginários e Furiosa tenham performances que compensem pela falta de longas com alto poder de arrecadação como Guardiões da Galáxia Vol. 3, Velozes & Furiosos 10 e A Pequena Sereia em maio do ano passado.
Uma coisa é Estrada da Fúria afundar nas bilheterias enquanto Era de Ultron e Jurassic World mantinham os cinemas vivos e ativos com suas arrecadações bilionárias. Outra bem diferente é Furiosa ter uma performance ainda pior e sem nenhum blockbuster do calibre desses dois para compensar.
Além disso, o altíssimo investimento em tais filmes, que praticamente exigem uma bilheteria acima dos US$ 400 milhões (algo alcançado por apenas três filmes hollywoodianos deste ano) para justificar o orçamento, também pode acabar sendo contraproducente no futuro. Por que a Warner investiria quase US$ 200 milhões num novo Mad Max de George Miller ou a Paramount entregaria US$ 110 milhões para John Krasinski fazer sua comédia dramática sobre amigos imaginários se esses filmes não geram receita o suficiente para compensar o investimento?
Por outro lado, se fossem feitos a um custo menor seria mais fácil de tais longas gerarem lucro ou ao menos de dar um prejuízo financeiro menos assustador. Com isso, o público que vai aos cinemas poderia ser convencido de comprar ingressos para produções não atreladas a marcas bilionárias como essas e logo novos filmes poderiam ser feitos com custos maiores.
Enfim, a temporada 2024 ainda trará Divertida Mente 2, Meu Malvado Favorito 4 e Deadpool & Wolverine, que são as grandes esperanças de boas bilheterias do ano. É bem provável que tais longas façam excelentes números e mostrem (mais uma vez) que a população ainda goste de ir ao cinema.
Mas enquanto isso não acontece, a indústria exibidora precisa se contentar com candidatos a blockbuster de potencial comercial medíocre, que farão com que a bilheteria anual seja assustadoramente menor que a do ano passado.